Nesse fim de semana, estava assistindo a um filme que fala bastante sobre o tempo e como ele é percebido por nós não pelo que está por vir, mas do que podemos perder com sua passagem. Essa época do ano é a pior para eu consumir esse tipo de conteúdo, mas vamos lá.
Em O Mapa das Pequenas Coisas Perfeitas, tem um diálogo incrível sobre essas nossas filosofias infinitas sobre como seres finitos lidam com o tempo.
— Sabe o que você disse sobre a quarta dimensão?
— Aquela que não é o tempo?
— Isso, ainda não é o tempo. Mas andei pensando sobre o que é e... Sabe que temos três dimensões, não é? Agora pense na sua sombra. Sua sombra é bidimensional. Plana. O que formaria uma sombra tridimensional? Essa é a quarta dimensão. Tecnicamente, somos só a sombra de pessoas quadridimensionais.
— Uau.
— É.
Quando ouvi essas falas sendo entregues no filme, a única coisa que consegui fazer foi discordar do autor e roteirista Lev Grossman. Tudo que ele me passou durante toda a sequência dos personagens discutindo sobre o assunto me fez pensar ainda mais sobre o tempo como uma verdadeira quarta dimensão.
Bem não exatamente. Essa quarta dimensão para mim não é o tempo em si, mas o que ele deixa para trás.
Nossas memórias são uma realidade existente, afinal elas aconteceram. Para todos os efeitos, aconteceram. Existe uma testemunha visual que são seus próprios olhos e às vezes até provas evidenciais bem fortes: fotos, mudanças no ambiente, áudios que você queria muito deletar mas já estão marcados como ouvidos.
O passado é algo que está ali, mas, ao mesmo tempo, é inacessível para nós. Não podemos revisitá-lo ou interferir, apenas contar com uma versão nada fiel e bem enviesada do que ficou.
Seria essa a verdadeira quarta dimensão? E se for, seríamos nós as sombras tridimensionais de tudo o que passou? Parece uma ideia interessante e naaaaada angustiante de se se pensar na época em que tudo que eu faço é analisar o passado.
O que eu poderia ter feito de melhor, quais foram as decisões-chave que me trouxeram a esse ponto e que formato minha sombra faria com algumas escolhas diferentes. É eu sei, faz muito pouco sentido pensar nisso. Mas a gente pensa mesmo assim, não é? NÃO ME VEM TIRAR O CORPO FORA AGORA.
Assim como uma dimensão à parte da nossa, o passado é algo que sentimos, que acreditamos ter existido e temos certeza que formou o presente. Mas se essa é a única forma de interagir com ele, a lógica se torna muito injusta, mesmo que bastante sólida.
Eu tenho muitos arrependimentos de escolhas feitas numa tarde de dois mil e qualquer coisa. E mesmo que erros sejam reversíveis, nunca são ao ponto da recuperação completa. A verdade é que naturalmente ficamos muito mais decepcionados com as decisões erradas do que orgulhosos das decisões certas.
(E diziam que éramos criações perfeitas, como alguém pode acreditar nisso de cara limpa?)
Mas essa ideia do tempo como uma quarta dimensão pode se transformar em um conforto também? Se o passado faz parte dela, também a faz o futuro. E se o futuro existe em alguma dimensão, isso significa que ele... já existe, certo? Eu não sei, entrei em uma área da física que tenho muito medo de cair em "5 formas de usar pensamento positivo para ganhar seu primeiro milhão".
Esse não é meu ponto e só nesse ponto do texto estou percebendo isso. (Sim eu estou formando este raciocínio enquanto escrevo, contra qualquer bom senso)
Meu ponto na verdade é que, levando toda essa viagem de ácido hipotética em questão, somos sombras formadas por dois focos de iluminação opostos: o passado e o futuro. Assim como você anda na rua à noite entre dois postes e vê duas perspectivas planas de você sendo projetadas no chão.
Se somos sombras tridimensionais de um mundo quadridimensional, não podemos tomar apenas o passado como ponto de vista para sua silhueta definitiva. O que vem pela frente também tem luz e as pistas sobre o que há no futuro podem servir para formar uma imagem melhor.
É apenas uma ideia de que o que aconteceu até aqui não necessariamente vai continuar acontecendo. Mesmo que seja apenas o ângulo, uma nova luz sempre traz novas possibilidades.
Obrigado, este é o fim do meu momento Walter Mercado. O curso ainda não existe, mas meus livros sim, então leia djá!
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