Eu não tenho mais aquele cheiro de carro novo

Playstation Vita

Em 2017 eu comprei um Playstation Vita.

EI! Não começa, ele era BEM LEGAL tá?

Durante quase um ano foi o lugar onde mais joguei meus jogos (eu vou falar no futuro sobre minha relação com jogos portáteis). Era meu xodó. Minha gracinha. Meu bem. Mas aí veio 2019 e um furto de carro levou ele de mim.

Um momento de silêncio.

Seguimos em frente.

Órfão de um portátil para chamar de meu, eu resolvi resgatar do fundo da minha gaveta meu PSP GO abandonado há algum tempo.

JÁ MANDEI VOCÊ PARAR DE QUESTIONAR AS MINHAS ESCOLHAS!

Eram pelo menos três anos sem nem encostar no aparelhinho quando voltei para ele. É encantador pegar essas relíquias da sua própria vida de vez em quando, mesmo que não seja tão do passado.

Passado mesmo foi o sentimento. Passou rápido. Logo depois veio uma sensação curiosa: eu já não tinha muito interesse mais em jogar no meu PSP.

Pensa nisso. Lógico que um console mais novo vai trazer jogos mais bonitos, mais avançados. Mas não é algo que eu me prenda muito. No fundo, a experiência que eu tenho jogando em qualquer um deles é basicamente a mesma.

Todo mundo conhece esse sentimento. É o famoso cheiro de carro novo. Quando vemos alguma novidade, acabamos diminuindo o que veio antes como algo obsoleto. Isso é óbvio, não dá para escrever mil palavras sobre isso.

Mas e sobre o dispositivo que você mais usou, gastou e se cansou de ver pela frente na sua vida? É, isso mesmo. Você.

Você aí.


Entendendo por que o Instagram dos outros é mais verde

Parece que todos as contas de Instagram no mundo tem um filtro especial que o seu não tem. A grama sempre fica mais verdinha. Deve ser alguma coisa no contraste, talvez?

É curioso quando a gente pensa que todo mundo tem as mesmas histórias de comparação para contar, de se sentir mal porque o filho da amiga da sua mãe tem uma casa de sete andares. Ele inventou a roda novamente, antes ela era menos redonda.

Isso não pode ser só comigo, certo? Nem só com você? Por que então a gente tá sofrendo tanto? A ideia que me veio é que eu sou o PSP Go da minha própria vida. Magrinho, sem muito poder de processamento, mas é mais que isso.

A questão aqui é de percepção. Enquanto nossas vidas nós acompanhamos a cada dia, cada erro, cada dúvida, cada dedo na quina, as novidades das outras pessoas são muito impactantes. Mais verdes.

Elas parecem sempre cheirar a carro novo.

É a mesma sensação que tive quando peguei um jogo antigo. Eu sou notícia velha. Minhas conquistas não apareceram na minha timeline, elas foram se formando aos poucos, gradualmente. Elas vieram, já se foram e eu não percebi.

Quando algo se torna muito familiar, isso sempre acontece. É como a acomodação sensorial que faz você parar de sentir um cheiro esquisito depois de um tempo, ou de seu cérebro ignorar que seu nariz está no seu campo de visão 100% do tempo E ESSE É MEU TROCO POR VOCÊ FAZER PIADA COM MEU VITINHA.

O que é mais familiar para você do que você mesmo? O que é mais empolgante para você do que pessoas novas fazendo coisas novas? São sentimentos tão intensos que você nem quer tirar o plástico para não perder aquela cara de novidade.

Eu acho que esse é o mecanismo que nos leva a diminuir nossas conquistas ao mesmo tempo que supervalorizamos a dos outros — e até damos justificativas para seus fracassos! A comparação sempre pesa contra nós mesmos.

Apostando em fragrâncias especiais

Como a gente foge desse sentimento? Bom, se você souber, pode me contar que eu ainda não descobri a resposta.

Mas talvez a pista esteja no que eu fiz quando minha empolgação pelo PSP diminuiu: eu olhei para ele por outros ângulos. Por um lado, dei um novo propósito a ele e me diverti jogando jogos ainda mais antigos em emulador, como uma mini máquina do tempo.

Mas, principalmente, fiquei um bom tempo admirando o aparelhinho em todos seus lados. Peguei um pano e um limpador de tela para deixar aquele black piano perfeito. Ele fez parte da minha história e ainda está aqui comigo. Ele não tem que ser excitante o tempo todo. Essa proposta é insustentável.

Pois é. Não dá para ser excitante o tempo todo. O que invejamos e comparamos nas outras pessoas são recortes bruscos, a versão editada delas mesmas. Nós somos um live feed da câmera de segurança na escada. De vez em quando alguém passa. Na maior parte do tempo nada acontece.

Isso não quer dizer de forma alguma que sejamos menos interessantes ou bem sucedidos do que essas outras pessoas. Nós apenas temos pouca paciência para evoluir. E quando finalmente evoluímos, já não é mais novidade.

Imagina um carro em que o cheiro de novo nunca sai. Deve enjoar, não é? É bom poder variar um pouco, testar fragrâncias novas. Você by You. Com propaganda conceitual e tudo.

E eu? Bem, eu comprei um 3DS algum tempo depois. Comecei com o ímpeto de jogar tudo que vier pela frente o mais rápido possível. Mas aí dei uma parada para pensar.

Eu tenho todo o tempo do meu mundo. Eu posso ir com calma e aproveitar. Tudo que eu sou vai continuar sendo parte de mim, mesmo que não seja novidade ou que alguém faça melhor.

Quer ler uns contos meus por aí? Vem conhecer eles aqui!



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